Nunca fui muito adepto aos modismos, isso explica muita coisa sobre o fato de não tolerar muito os famigerados internetês e miguxês. Já li muita coisa a respeito, inclusive de docentes defendendo o direito à comunicação de todos, independentemente do modo como expressam.
Imagem: Canal do Educador
É claro, é direito de todos usar as ferramentas disponíveis como melhor lhe convierem, inclusive fazendo uso de elementos que ninguém sabe ao certo de onde e surgiu e onde vai parar. Ocorre que é meu direito também não querer usar e achar que certas pessoas também não deveriam, nesse caso, especialmente educadores.
Já vi alguns defendendo que o mais importante do que a forma de comunicação é o fato da pessoa comunicar-se, invocando inclusive o tal preconceito linguístico, para balizar tão conceito.
Penso que estou na contramão da história, acho tão bacana a pessoa que sabe usar bem o nosso idioma e, penso eu, isso deveria ser feito em todas as situações, pois todos só têm a ganhar. Acho que, por enquanto, não são aceitos os termos “miguxanos” e “internetanos” em concursos e provas. Eu disse por enquanto, porque não duvido nada se em breve aparecer um novo acordo ortográfico incorporando tais termos ao nosso idioma.
Alguns me acham radical e retrógrado, dizendo que temos que nos adaptar aos “novos tempos”, que querendo ou não isso já está arraigado no nosso convívio, ou aprendemos a lidar com isso ou estaremos fadados a não obter um canal de diálogo com os jovens. Cada dia que passa eu entendo menos a cabeça desse povo.
É bem verdade que as gírias não são invenções recentes, e, tais termos, nada mais são do que novas gírias, senão vejamos: segundo a Wikipédia “gíria é um fenômeno de linguagem especial usada por certos grupos sociais pertencentes à uma classe ou a uma profissão em que se usa uma palavra não convencional para designar outras palavras formais da língua com intuito de fazer segredo, humor ou distinguir o grupo dos demais criando uma linguagem própria (jargão).É empregada por jovens e adultos de diferentes classes sociais, e observa-se que seu uso cresce entre os meios de comunicação de massa.”
Sobre o efeito desse fenômeno no aprendizado, vemos que entre os especialistas também não há um consenso:
Eduardo Martins, autor do Manual de Redação do jornal O Estado de S. Paulo, olha com reservas o fenômeno. - “O aprendizado da escrita depende da memória visual: muita gente escreve uma palavra quando quer lembrar sua grafia. Se bombardeados por diferentes grafias, muitos jovens ainda em formação tenderão à dúvida – alerta”.
O Sírio Possenti, professor de lingüística da Unicamp, assegura que não existiria fator de risco. - “Uma coisa é a grafia; outra, a língua. Não há linguagem nova, só técnicas de abreviação no internetês. As soluções gráficas são até interessantes, pois a grafia cortada é a vogal. A palavra "cabeça", por exemplo, vira "kbça", e não "aea". A primeira forma contém os fonemas indispensáveis ao entendimento”. [Revista Língua]
Já o professor de português Sílvio Luís Bedani, do Colégio Marista Arquidiocesano, em São Paulo, argumenta que com certa preocupação: - “A internet acostuma o usuário a lidar com as várias linguagens e mídias, o que ajuda dentro da sala de aula. O "multiletramento", como chama Bedani, que a internet proporciona faz do aluno um produtor de texto criativo. Ou seja, a web não é vilã nessa história. Tudo é uma questão de medida.
Mas "o aluno abre mão de tudo para ficar no computador", lamenta. A consequência é notada quando se precisa escrever textos argumentativos. Ele simplesmente não tem base, porque se afastou dos jornais e das obras de ficção. "O estudante não costuma ter conhecimento de mundo. O mundo dele é o vídeo-game e a internet." [Terra]
Particularmente não gosto do uso de tais termos, assim como bem frisou o professor Eduardo Martins, também sou de opinião que o uso excessivo pode ocasionar dúvidas em relação a grafia correta da palavra, quando de uma prova, redação ou concurso. Os que defendem o uso dos termos alegam que é importante a escola ensinar a diferenciar o emprego da linguagem de acordo com as situações.
Segundo o Relatório de Monitoramento de Educação para Todos de 2010, da Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (Unesco), a qualidade da educação no Brasil é baixa, principalmente no ensino básico. [Estadão]. Ora, se as escolas não estão conseguindo prover os alunos do aprendizado básico, como iremos exigir que os educadores introduzam elementos para diferenciar o uso de tais termos de acordo com a situação?
O Brasil ocupa o 53º lugar em educação, entre 65 países avaliados (PISA). Mesmo com o programa social que incentivou a matrícula de 98% de crianças entre 6 e 12 anos, 731 mil crianças ainda estão fora da escola (IBGE). O analfabetismo funcional de pessoas entre 15 e 64 anos foi registrado em 28% no ano de 2009 (IBOPE); 34% dos alunos que chegam ao 5º ano de escolarização ainda não conseguem ler (Todos pela Educação); 20% dos jovens que concluem o ensino fundamental, e que moram nas grandes cidades, não dominam o uso da leitura e da escrita (Todos pela Educação). Professores recebem menos que o piso salarial (et. al., na mídia). [Brasil Escola]
Como vimos a situação da educação no Brasil renderia outro post, mas o intento deste escriba que vos fala não é analisar tal questão, mencionei os dados apenas a título ilustrativo para respaldar minha opinião divergente em relação ao emprego da linguagem da internet. Se o sujeito que faz uso do internetês e miguxês, mas tem plena consciência da restrição do uso apenas em redes sociais e comunicação informal, tudo bem! Mas na prática não é isso que vemos, atualmente é muito comum professores se depararem com tais termos em redações escolares e muito provavelmente em concursos públicos.
Recentemente minha esposa ficou pasma ao conversar com uma tia, Diretora de Escola, no Facebook e ela abusar dos termos habitualmente usados na internet. Particularmente tenho lá minhas dúvidas se é correto um educador “entrar na onda” desses modismos habituais em nome da facilidade de interação. Como bem preceitua o adágio popular “o bom exemplo é sempre mais eficaz do que o melhor conselho”.
Definitivamente eu tenho a maior dificuldade em entender o que alguns jovens falam na internet, dia desses, conversando com uma sobrinha, tive que pedi-la que traduzisse a mensagem que ela havia me enviado. Para os anacrônicos como eu, saibam que alguém já criou um tradutor denominado Miguxeitor, que traduz textos para o miguxês arcaico, moderno e neo-miguxês.
Enquanto isso, nós continuamos longe de atingir a meta de alfabetizar todas as crianças até os 8 anos de idade e carregando o fardo de um baixo desempenho no IDEB. Com o índice de aprovação na média de 0 a 10, os estudantes brasileiros tiveram a pontuação de 4,6 em 2009. A meta do país é de chegar a 6 em 2022. [Brasil Escola]
É bom seguir algumas dicas importantes:
1. Diversidade. A internet tem muito mais recursos que bate-papo e redes sociais. Aproveite para estudar, ler notícias, artigos acadêmicos, baixar livros.
2. Confiabilidade. Na rede, qualquer um escreve o que quiser. Desconfie, investigue e procure outras fontes.
3. Exagero. Não deixe de ler um livro, conversar pessoalmente, ter atividades físicas para ficar online.
4. Zelo. Ao escrever na internet, você pode ter muitos leitores - mais do que na redação da escola. Por isso, capriche no texto. [Estadão]
De minha parte, mesmo ciente das limitações, prefiro continuar tentando comunicar em uma linguagem mais formal. Mas respeito o gosto e as opiniões divergentes, afinal: “A finalidade da comunicação é fazer-se entender. Mas há quem prefira se desentender”. [Augusto Branco]
Sobre o Autor:
![]() | José Márcio - Editor Chefe dos Invicioneiros, leitor voraz e aprendiz de escritor.Tem opinião e assume os riscos Saudosista dos anos 80. E palpiteiro inveterado. Me Siga no Twitter [@jmpsousa]. |
4 comentários :
Prezado Zé, é claro que não poderia deixar de comentar. Como professor de Língua Portuguesa há 25 anos, vejo também com muitas reservas essas variantes linguísticas, se é que podemos denominá-las assim. Não posso ser preconceituoso em relação a elas, no entanto. Respeito-as como parte de um fenômeno associado em parte à tecnologia e às exigências da vida moderna. Mas o grande mentor da língua é o povo. E os falantes (o povo), por enquanto, não admitem substituir os atuais "padrões" linguísticos por modismos como o miguchês e o internetês. Como educadores, devemos orientar a respeito do uso dessas modalidades somente em situações específicas. O problema é que isso acaba se tornando um vício e os usuários acabam se esquecendo de como escrever de acordo com o padrão culto vigente.
18 de novembro de 2011 às 08:15#The EDN, você deve presenciar esses termos nas provas e redações dos seus alunos constantemente não é verdade? Fico temeroso exatamente por isso, a pessoa não saber diferenciar o estilo da escrita ao local onde se encontra, ou pior, esquecer os termos corretos.
21 de novembro de 2011 às 15:00@José Márcio
24 de novembro de 2011 às 13:26É isso aí... Infelizmente, isso acaba se teansformando em mau hábito.
Oi Zé, gostei muito do seu artigo. Continue lutando por nossa língua portuguesa.
11 de junho de 2012 às 14:01Postar um comentário
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