Vejo notícia no jornal Estado de Minas, reproduzida no respectivo sítio, de que Minas proibirá o uso de panelas de cobre. Soa-me um pouco absurda a notícia e fico meio atônito.
Criado que fui em cidade do interior, em casa onde tacho de cobre era usado para fazer doce e para fritar toicinho para torresmo e gordura de guardar carne de lata, fico sem entender a princípio. Leio a notícia toda e vejo que é coisa da Vigilância Sanitária do estado, fundamentado em resolução de 2007 da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Segundo a autarquia, o uso do cobre das panelas e utensílios na produção alimentícia, desde que absorvido pelo organismo, gera problemas neurológicos e psiquiátricos (quem criou essa lei deve ter comido muito doce, carne de lata e torresmo de Minas), danos ao fígado, rins, nervos e ossos, além da perda de glóbulos vermelhos.
Fico pensando com os botões que minha blusa não tem, nesta noite fria em que redijo esse post, que muita gente morreu nesses séculos que passaram por causa disso. Pobrezinhos! Se nossos antepassados tivessem na época uma Anvisa e uma Vigilância Sanitária tão eficiente, provavelmente teriam vivido muito mais e não teriam tido tantos problemas de saúde.
Vai dar saudade! Aqueles deliciosos doces de figo, de cidra e de mamão verde (e ainda mais verdes nos tachos de cobre), de laranja da terra, de leite e aquela goiabada cascão... Nunca mais em Minas, minha mais melancólica memória de mãe e de mães. Aliterações alteradas em assonâncias, substâncias do passado irretornável, neologismo surgido da necessidade de palavra adequada.
Escrevo esse post penalizado e ao mesmo tempo pensativo... Será que no interiorzão, como nessa minha terra de Clara Nunes, Dona Eva vai seguir essa lei? De meu lado, quanto a essa lei, uma leitoa comprarei no mês de setembro e outra no início de dezembro, lá na fazenda do Celião do Beira-Rio, daqueles bichos criados na larga no pasto, caipira que fala uai. Vou fritar em tacho de cobre e comer com mandioca e laranja capeta para cortar a maldade, cultivando a tradição de Minas, sem medo do aviso da Anvisa.
Sobre o Autor:
The EDN - sou industriário, trabalho há 27 anos na Cedro (indústria têxtil centenária de Caetanópolis, MG) e atuo como professor há 24 anos em escolas particulares e públicas |
19 comentários :
Dessa vez esse post me remeteu a duas lembranças distintas, primeiro da infância, quando uma vizinha, a 02 casas da nossa, tinha umas goiabeiras no quintal, fazia doce de goiaba em pasta e em calda, uma delícia, e no tacho de cobre.
17 de agosto de 2010 às 23:37Outra lembrança é da famosa carne de lata, quando morei em BH para estudar , cursinho/faculdade, minha saudosa avó fazia carne de lata para mim, e eu comia a semana toda quando ela mandava. Boas lembranças, deu até água na boca.
Essa ANVISA e seus técnicos...
Engraçado isso, porque até onde eu saiba, todas as panelas (com exceção somente das de vidro e titânio) podem liberar resíduos na comida... panela de inox libera Ni, de cerâmica, Pb, de ferro libera Fe, de teflon libera aminas (cancerígenas, inclusive).
18 de agosto de 2010 às 08:34Tudo depende, na verdade, é das condições de uso e de limpeza.
Tema providencial!
18 de agosto de 2010 às 09:38Estamos vivendo a "Era da Frescura"...
1 - Não se pode mais brincar com a torcida adversária nos estádios (Estatuto do Torcedor);
2 - Todos são culpados até prova em contrário (Lei da Ficha Limpa);
3 - Pica Pau, volume 6, está sendo censurado...
4 - Os pais não podem mais corrigir os seus filhos...
A comentarista Jeane do Rosário tem razão: também terão que acabar com todas as panelas de aço em Minas...
Seguindo a linha de seu "post", eu estou indignado com a ideia de que nos açougues de Caetanópolis e Paraopeba não existem mais a famosa "dobradinha" (ou "bucho") disponível. Será que as autoridades sanitárias acham que as pessoas comem esta iguaria sem o cozimento?
Olha, se a Vigilância Sanitária continuar assim, vamos comer apenas enlatados e olhe lá. E o pior, é que eles não têm noção dos R's ambientais. Pois, ao exigirem que tudo esteja embalado estão aumentando a geração de resíduos e com isso causando mais problemas de saúde do que antes. E ao invés de buscarem soluções alternativas para aumentar a geração de renda estão aumentando desemprego.
18 de agosto de 2010 às 13:03Prezado Erlon, suas lembranças são de um tempo de carinho e aconchego, tão bem traduzidas na metáfora da panela de cobre e a tradição que representam em Minas Gerais. Visite-nos mais vezes!
18 de agosto de 2010 às 14:54Cara Jeane, você definiu bem: tudo depende das condições de higiene e limpeza. Sem isso, até as de vidro e de titânio trarão problemas.
Coqueiro, sem dúvida vivemos a "Era da Frescura"... E o exemplo que você citou em relação a Caetanópolis é uma simbologia dos extremos representados por essa ditadura. Por que não perguntam aos fregueses o que eles querem?
Sandrinha, que ótimo receber seu primeiro comentário, aliás, muito pertinente e feliz: os impactos ambientais gerados por atitudes como essas são muito mais prejudiciais à saúde. Sem falar nos impactos sociais, como o desemprego de muita gente por causa dessa "frescura" desenfreada.
Mais uma imbecilidade da terra brasilis. Deviam proibir o horário político obrigatório, ele é muito mais nocivo a nossa saúde do que o coitado do cobre.
18 de agosto de 2010 às 16:34Bem, como sou de Sampa, não sabia que existiam panelas de cobre... Na verdade não conheço panela nenhuma, já que o fogão é algo que tenho medo de explorar... :)
18 de agosto de 2010 às 21:20"Libertas Quæ Sera Tamen"
19 de agosto de 2010 às 11:29A Anvisa está fazendo o favor de nos libertar das sandices criadas por nossos antepassados, quando introduziram em nossa cultura o terrível hábito de degustarmos as mais diversas iguarias mineiras.
Morte ao tacho de cobre! Morte ao deplorável toucinho! Morte ao deleitoso doce de figo (com queijo minas)!
Ah, que saudade da minha infância...
É verdade, Zé Márcio, embora durante o horário político é possível fazer outras coisa que não seja ficar defronte à TV, como, por exemplo, degustar uma comidinha de angu feita em panela de ferro e, de sobremesa, um doce de figo e/ou de leite com um queijinho gostoso (não é mesmo, Ricardo?).
19 de agosto de 2010 às 12:47Crazyseawolf, como velho marinheiro, certamente você tem quem cozinhe para você. Experimente as delícias de Minas Gerais, começando pelos pratos a base de carne de porco.
oi EDN
19 de agosto de 2010 às 13:00Eu já comi comida de panela de todo tipo de material: cobre, barro (aliás o feijão na panela de barro da minha avó era inigualável), vidro, inox, teflon e etc e nunca morri por isso.
Se formos olhar tudo hoje dá câncer, viver também dá câncer sabia disso? rs
Nossas crianças estão ficando alérgicas e com problemas crônicos devido ao excesso de zelo, as mães protegem tanto que a criançca fica sem anticorpos e também somando-se a isso tem o fácil e descontrolado acesso as bombas calóricas.
Não precisamos ser chegados em cozinha pra detectar o óbvio: o problema não está na panela e sim no uso e na cultura, onde se morre de qualquer coisa e ninguém lá sabe explicar se foi a panela, o garfo, o copo, enfim... melhor pararmos de cultivar estes fantasmas e viver o que a vida tem de bom, com moderação é claro.
Um Abraço :)
@The EDN
19 de agosto de 2010 às 16:37Minas é um estado abençoado.
Além da vasta cultura barroca e o rococó, a culinária mineira é de deixar qualquer um boquiaberto. Destacando, como citado por você, as iguarias com carne de porco e os deliciosos doces artesanais.
Definitivamente não temos do que reclamar.
"Tuas terras que são altaneiras
O teu céu do mais puro anil
És bonita, ó terra mineira
Esperança do nosso Brasil!"
Prezada Ana, como você definiu bem! O problema não está panela, mas na questão cultural. Ninguém pode viver feliz cercado de fantasmas provocados pela paranoia exacerbada de alguns.
20 de agosto de 2010 às 08:43Caro Ricardo, a culinária mineira é de fato maravilhosa, bem como a culinária brasileira, de um modo geral. Ontem mesmo deliciei-me com um molho de mamão verde com torresmo e almeirão, acompanhado de costelinha de porco frita e uma pimentinha malagueta... Huummm!
"Ontem mesmo deliciei-me com um molho de mamão verde com torresmo e almeirão, acompanhado de costelinha de porco frita e uma pimentinha malagueta... Huummm!"
20 de agosto de 2010 às 09:35KkKkKkKkKkKkK! Haja plano de saúde e vaga no Cemitério São Dimas!!!
Lembrei-me de uma frase célebre do Jaguar, quando no início dos anos 2000, a Vigilância Sanitária carioca andou fechando botequins do Rio de Janeiro:
"Eu nunca ouvi falar de que alquém que comesse um petisco de boteco e morresse. Já de infecção hospitalar..."
Olha a lista do The EDN:
21 de agosto de 2010 às 14:19doces de figo, de cidra e de mamão verde, de laranja da terra, de leite com queijo, goiabada cascão, comida de angu, molho de mamão verde, leitoa, mandioca, torresmo, carne de lata, almeirão, costelinha de porco...mais a pimenta malagueta.
Concordo com o Harley sobre o plano de saúde.KkKkKkKkkkKkK!
E é bom ver se há por aí também uma boa academia.
Abraços, The EDN, e continue a defender as nossas tradições.
Toda mineira que se preza tem um tacho de cobre em casa pra fazer doce de leite e de frutas. Quem usa tacho de cobre sabe que ele deve ser lavado com laranjinha capeta e sal pra tirar o zinabre,(azinhave), aquelas manchas esverdeadas que atacam o cobre. Em seguida, lavar com água e sabão, secar e usar imediatamente, antes que o zinabre ataque o cobre novamente. A boa mineira sabe também que nunca se deve fazer comida de sal em tacho de cobre. Lembro-me de um casamento na casa do João França, interior de Minas (São Vicente - Baldim)onde todos os convidados tiveram um desarranjo intestinal, sem maiores consequências, por conta de uma macarronada feita no tacho de cobre.Como diziam os antigos a comida enzinabrou.Os menos avisados da Envisa e da Vigilança Sanitária se conhecessem um pouco da nossa tradição mineira, certamente não iriam proibir o uso dos tachos de cobre.
22 de agosto de 2010 às 21:42Ai, ai... morro de saudades da minha infância, que os anos não trazem mais :( E tacho de cobre é uma das coisas deliciosas dela.
23 de agosto de 2010 às 22:36Quanto doce comi feito nestes recipientes tão perigosos.
Papai, entre outras coisas, fazia tachos de cobre MARAVILHOSOS como hobby, e adorava cozinhar doces ali.
Humm!! Se neste instante minha saudade tivesse cheiro seria de doce de mamão, doce de leite e que doce de leite, fininho, fininho, derretia na boca. Ele era ótimo cozinheiro. Muito bom mesmo!
E o engraçado, é que se isto fosse assim tão dramático, mais da metade dos mineiros já estariam no Céu! Fala sério! E como disse a Ione, toda mineira que se preza sabe lavar bem um tacho para usá-lo sem que isto cause danos a saúde.
Respeito muito a ANVISA como órgão sério que sei que é, mas já que o problema é o metal que pode prejudicar o organismo humano, pq então, ela – a ANVISA – não interdita alguns órgãos públicos que soltam “ferro” na população brasileira?
Coqueiro e Professora Cida, sem dúvida é uma lista pesada, mas compensada pela prática esportiva diária e semanal (a famosa "pelada" onde mostro meu faro de artilheiro invicioneiro).
24 de agosto de 2010 às 15:50Cara Ione, ninguém melhor que você, de Baldim, a cidade do doce (e um doce de cidade) para comentar a respeito do uso do tacho de cobre. Valeu muito o conjunto de explicações de quem conhece de fato as tradições do interior de Minas.
Kinha, seu comentário foi muito procedente e o depoimento também. Obrigado pela visita e por enriquecer nosso blog com suas palavras.
Luna di Paula, a anônima, está aqui para enzinabrar a comida de vocês. Lamento dizer, mas hoje se sabe que o cobre causa danos terríveis à saúde. E o Ministério da
9 de abril de 2011 às 20:51Saúde adverte, há muito mais tempo, que o cigarro causa inúmeros tipos de câncer, problemas circulatórios gravíssimos, danos aos fetos, entre outros; mas não proibiu a venda de cigarros. Que o big Mac e as batatas fritas causam entupimento das artérias, hipertensão arterial, obesidade e podem levar à morte. Que associar brinquedos ao lanche causa problemas psicológicos nas crianças. Por que será que não proibiram?
Antigamente eu comia as coisas fritas na banha de porco ou na gordura vegetal, as verduras eram plantadas em hortas adubadas com esterco, sim, coco de cavalo! Hoje são chamadas de "orgânicas". Aliás, tudo que eu consumia antigamente era orgânico isso a meio século atrás! Por que o nome diferente hoje? Quanta frescura se inventa né? Agora uma equipe duvidosa taxa o cobre como nocivo à saúde. Muita coisa que se usa ha séculos, vão ser colocadas como nocivas à saúde. Por que não combatem o cimento, o automóvel com motor a explosão, o petróleo, as bebidas alcoólicas, o cigarro, os refrigerantes, os fast foods, o inchaço imobiliário, e principalmente o mal de todos: OS POLÍTICOS CORRUPTOS?
23 de fevereiro de 2012 às 22:53Postar um comentário
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